STF condena Jair Bolsonaro a 27 anos por tentativa de golpe; placar é 4 a 1 e impõe multa milionária

set 12, 2025

STF condena Jair Bolsonaro a 27 anos por tentativa de golpe; placar é 4 a 1 e impõe multa milionária

STF condena Jair Bolsonaro a 27 anos por tentativa de golpe; placar é 4 a 1 e impõe multa milionária

Pela primeira vez na história do país, um ex-presidente foi condenado por crimes ligados a tentativa de subversão da ordem democrática. Em decisão apertada, mas simbólica, a Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) sentenciou Jair Bolsonaro a 27 anos e 3 meses de pena por sua atuação após a derrota nas eleições de 2022. A maioria dos ministros reconheceu que houve uma articulação para tentar impedir a posse do vencedor e manter o então presidente no poder.

O placar ficou em 4 a 1. Votaram pela condenação Alexandre de Moraes (relator), Flávio Dino, Cármen Lúcia e Cristiano Zanin. Luiz Fux divergiu e, na maior parte dos pontos, votou pela absolvição do ex-presidente. Além de Bolsonaro, sete aliados foram condenados no mesmo conjunto de acusações, com variações de pena. O caso encerra uma etapa e abre outra: recursos da defesa e a fase de execução da pena.

Como foi o julgamento

A Primeira Turma analisou um conjunto de crimes atribuídos ao ex-presidente e a seus aliados, todos ligados ao período que se seguiu ao segundo turno de 2022. A tese central da acusação era de que houve uma estratégia organizada para minar a confiança no resultado, arregimentar suporte operativo e criar as condições para um rompimento institucional.

Os ministros condenaram Bolsonaro por cinco crimes:

  • organização criminosa armada;
  • tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito;
  • golpe de Estado;
  • dano qualificado por violência ou grave ameaça;
  • deterioração de patrimônio público.

Na dosimetria, Moraes levou em conta a posição de comando de Bolsonaro e a extensão do dano institucional, aumentando a pena base. Também aplicou atenuante por idade, como manda a lei. O resultado foi uma pena total de 27 anos e 3 meses, sendo 24 anos e 9 meses de reclusão e 2 anos e 6 meses de detenção, com início em regime fechado. Houve ainda 124 dias-multa, fixados em dois salários mínimos por dia.

Para quem não acompanha termos jurídicos todos os dias, vale a tradução: reclusão e detenção são espécies de pena de prisão previstas no Código Penal; a primeira, mais grave, costuma começar no fechado. A progressão de regime (para semiaberto e aberto) depende de tempo cumprido, bom comportamento e outros critérios legais, definidos depois, na execução penal. Já o “dia-multa” é uma multa calculada em dias, com um valor diário que varia conforme a condição econômica do réu.

Na mesma linha, a Turma condenou sete aliados do ex-presidente. Um caso se destacou: o deputado federal Alexandre Ramagem foi punido por três dos cinco crimes (organização criminosa armada, tentativa de abolição violenta da ordem democrática e golpe de Estado). Com isso, perdeu o mandato e também o cargo de delegado da Polícia Federal. Anderson Torres, outro nome do núcleo político e de segurança, perdeu o posto de delegado da PF.

O ex-ajudante de ordens Mauro Cid teve tratamento diferenciado por causa do acordo de colaboração firmado com a Procuradoria. Os ministros negaram perdão judicial, mas preservaram os benefícios pactuados: 2 anos de pena em regime aberto, devolução de bens e valores, extensão de vantagens a familiares próximos e proteção policial para ele e a família. Em outras palavras: não é absolvição; é uma pena menor por ter colaborado com as investigações.

Além da prisão, a Turma aplicou sanções civis e eleitorais. Os condenados terão de pagar, de forma solidária, R$ 30 milhões por danos morais coletivos — uma reparação que o Supremo entendeu devida pelo ataque às instituições. Todos ainda ficam inelegíveis por oito anos, com base na Lei da Ficha Limpa. No caso de Bolsonaro, a inelegibilidade já vigorava desde junho de 2023, por decisão da Justiça Eleitoral, e agora se mantém por nova via.

Efeitos concretos da condenação

Efeitos concretos da condenação

A decisão do STF tem efeito imediato em vários planos. No criminal, começa a contagem para a execução da pena, o que inclui expedição de comunicações aos órgãos responsáveis e definição de regras específicas de cumprimento. Bolsonaro já estava em prisão domiciliar com tornozeleira eletrônica, por ordem cautelar anterior, e isso agora será reavaliado à luz da condenação e do regime fechado inicial fixado na sentença.

No funcional, as perdas de cargos já mencionadas (Ramagem e Anderson Torres) se consolidam com a condenação. No eleitoral, a inelegibilidade por oito anos afasta qualquer tentativa de retorno às urnas no curto prazo. No civil, a cobrança do valor de R$ 30 milhões tende a avançar em fase própria, com possibilidade de bloqueio de bens dos condenados para garantir a execução.

Há também o campo dos recursos. Como a condenação veio da Primeira Turma do STF — e o caso teve início no próprio Supremo — não existe um tribunal “acima” para onde recorrer. A defesa pode apresentar embargos de declaração para pedir esclarecimentos e tentar ajustar pontos da decisão. Pode também insistir em levar a discussão ao Plenário, algo que depende de aceitação interna. Em paralelo, pode buscar medidas cautelares pontuais para discutir o regime de cumprimento. Nada disso, porém, suspende automaticamente a condenação.

No mérito, o julgamento deixa um recado que o mundo jurídico vai dissecar por anos: tentativa de ruptura institucional, mesmo quando não consumada, gera responsabilização penal severa para líderes e operadores. A leitura majoritária foi a de que a cadeia de atos após o pleito de 2022 não foi um conjunto de arroubos retóricos, mas um projeto com divisão de tarefas. Essa conclusão pautou tanto a escolha dos crimes quanto a dosimetria pesada.

Importa notar a estrutura da votação. O relator Alexandre de Moraes conduziu a instrução do caso, reuniu provas, decidiu incidentes e apresentou voto pela condenação. Flávio Dino, Cármen Lúcia e Cristiano Zanin acompanharam. Fux abriu divergência e, em pontos centrais, entendeu que não havia prova suficiente para alguns tipos penais. O 4 a 1 final mostra um Supremo com maioria consolidada no tema, mas não unânime.

O caso começou formalmente quando, em março de 2025, a Primeira Turma recebeu a denúncia e transformou Bolsonaro e sete integrantes do núcleo em réus. O julgamento agora fecha o ciclo de conhecimento e abre o de execução. O Supremo costuma separar essas etapas: primeiro decide se condena ou absolve; depois, em atos internos e com apoio do sistema de Justiça, faz a sentença “sair do papel”.

No campo político, a decisão redesenha o tabuleiro. O ex-presidente, que já estava fora da disputa eleitoral, fica sob o peso de uma sentença penal. Aliados, agora condenados, perdem fôlego e acesso a cargos-chave. O governo e o Congresso acompanharão os próximos passos de perto, especialmente no que diz respeito a reações nas ruas e à segurança institucional. Por ora, não há indicação de medidas de exceção; a execução segue o rito comum, com monitoramento das autoridades.

Para quem pergunta “e agora?”, há três fronts práticos:

  • Execução penal: definição de local, condições e eventuais progressões de regime conforme a lei e a conduta do apenado;
  • Recursos: embargos de declaração e pedidos para levar pontos ao Plenário, com baixa chance de reviravolta ampla, mas com espaço para ajustes cirúrgicos;
  • Cobrança civil e eleitoral: andamento da indenização e comunicação à Justiça Eleitoral para registro das inelegibilidades.

Na ponta, o recado do STF é nítido: a Constituição de 1988 tem mecanismos para punir líderes políticos que atentem contra o Estado Democrático de Direito. O processo foi longo, com produção de provas, colaborações premiadas, perícias e debates públicos. O Supremo fechou questão no que considerou serem os eixos de uma tentativa de golpe de Estado, apontando liderança, organização e execução.

Vale atenção a Mauro Cid, peça-chave pela colaboração. Ao manter o acordo, o STF reforça uma lógica já conhecida: delação não apaga o crime, mas reduz pena quando traz fatos, documentos e caminhos de investigação. A manutenção da segurança para ele e familiares indica que o tribunal considera ainda haver risco real, algo comum em casos de alta tensão política.

O ponto da multa também pesa. Os 124 dias-multa, a dois salários mínimos diários, somam um valor expressivo. Esse tipo de pena mira o bolso e tem um componente pedagógico: desestimular repetição de condutas e sinalizar que o dano social não é “gratuito”. Já os R$ 30 milhões por dano moral coletivo funcionam como uma espécie de “conta” pela corrosão institucional gerada pelo plano golpista.

Para além do momento, a sentença deve virar referência em cursos de Direito e nos tribunais. Pela primeira vez, um ex-presidente foi condenado por golpe de Estado e tentativa de abolir, com violência, a ordem democrática. Isso cria parâmetros: o que é discurso político duro e o que é ação organizada para romper a Constituição; como calibrar penas; quando a liderança agrava a responsabilidade. Em termos práticos, outros processos menores, ramificados desse núcleo, tendem a usar a decisão como norte.

Bolsonaro e seus advogados ainda têm estrada pela frente. Devem insistir em nulidades, questionar provas e tentar reduzir a pena. Há espaço para ajustes pontuais? Sim. Há espaço para uma guinada que derrube a condenação inteira? Com a maioria formada e a robustez do voto do relator, isso parece improvável. Mas o jogo nos tribunais, como se sabe, não acaba no apito final: sempre há prorrogação na execução e nos detalhes.

Neste momento, porém, a fotografia é esta: decisão colegiada do STF, pena longa, multas altas, perda de cargos e inelegibilidade. Instituições funcionando e cobrando responsabilidade de quem, segundo a Corte, tentou subverter o resultado das urnas. Esse é o tipo de marco que reescreve capítulos da vida política brasileira.

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